Vou acumular, nesse post,
assuntos de duas semanas porque eles estão intimamente ligados. Desde que
voltei a estudar estou escrevendo praticamente só sobre coisas da pós. Quem
acompanha o blog vai acabar estudando junto comigo. Mas não mudei, por isso,
minha escrita, pois apenas aproveito os ganchos que surgem em sala de aula para
continuar, com sempre, expondo minha opinião sobre as coisas que me cercam.
O assunto central do post de hoje
começou na aula de sábado, 18 de Maio, onde assistimos ao filme “A Onda” (Die
Welle), filme alemão que traz a história verídica de um grupo de alunos que em
um curso de uma semana tem sua vida mudada. Ao trabalhar o tema “Autocracia”, o
professor percebe no grupo uma certeza de que o nazismo jamais voltaria a acontecer,
que a sociedade estava, por assim dizer, “vacinada” desse mal. Baseado nisso, monta
com os alunos um grupo intitulado “A onda”, levando em consideração as normas
de conduta, espírito coletivo, disciplina e a busca de um bem maior. Esse grupo
tem um impacto diferente em cada um que faz parte dele, impacto esse que
depende do contexto familiar, e principalmente do contexto social dos
adolescentes. Eles passam a se defender entre si – mesmo os que anteriormente
tinham alguma diferença – porque “um grupo unido é mais forte”. Ao final da
semana devido a uma cadeia de acontecimentos o professor se vê obrigado a
desmanchar o grupo, pois as atitudes do mesmo tomaram proporções que fugiram do
controle de todos. Esse término foi extremamente traumatizante e trágico, mas
fica a lição de que É SIM possível, mesmo depois do mundo conhecer as
consequências do nazismo e do stalinismo, um bom articulador manipular um grupo
de pessoas atacando suas principais carências e necessidades e usar disso para,
sorrateiramente, impor seus ideais e mobilizar uma sociedade para segui-los. Foi
o que fez Hitler, foi o que fez o professor (com o objetivo de mostrar que isso
ainda era possível), e cada qual em seu grau de proporção, é o que as relações
de poder fazem.
Aí entra a aula de sexta, 24/05,
onde o tema foi Foucault. A parte de sua obra abordada resumidamente na aula
foi exatamente o que diz respeito às relações de poder. O pensador defende que
toda relação de poder é repressora, por mais que possa servir para dar voz e
vez para aquele que era oprimido e marginalizado, em algum momento esse poder
se tornará repressor.
Toda a discussão riquíssima de
sexta fez, pelo menos pra mim, um link direto com a aula de sábado, 25/05,
quando o professor Rogério Maia Garcia, professor do curso de Direito, veio a
convite à minha turma falar sobre a questão dos tóxicos e contextualizar,
através de uma linha do tempo no que diz respeito à legislação que abrange o
tema, o impacto desse problema na sociedade. O que se seguiu foi uma abordagem
clara e prática do que representa a droga propriamente dita no sistema carcerário,
o impacto direto na sociedade e como isso tudo vem sendo tratado pelas políticas
públicas. Foi inevitável não citar a notícia do momento: o Projeto de Lei
7663/10 do Deputado Federal Osmar Terra, que defende a internação compulsória
do dependente químico. Não entrarei aqui em detalhes, caso contrário o texto
ficará mais extenso do que está caminhando para ser, mas a lei – caso promulgada
– dará um tratamento completamente arbitrário e levará para a instância
judicial um problema que é, acima de qualquer outra coisa, de saúde pública.
Tudo isso, a meu ver, está interligado.
Explico: o filme, a discussão sobre Foucault e a internação compulsória tratam
das relações de poder. No filme o professor reproduz com seus alunos o impacto
do poder exercido sobre um grupo de pessoas em uma das épocas mais sombrias da
história da humanidade; e o projeto do Osmar Terra (e fico feliz ao perceber
que esse não é um ponto de vista apenas meu, mas de muita gente) vem através
das relações de poder da política X povo e o auxílio total da mídia,
convenientemente visar tirar da rua o dependente químico que está “enfeiando”
as cidades justamente pouco antes da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de
2016. É, como tenho ouvido muito ultimamente, uma higienização social para maquiar
uma realidade.
O projeto desconsidera o grau
dependência do usuário, assim como a falta total de estrutura para os
dependentes que hoje, voluntariamente, procuraram internação e não encontram. O
que se sugere caso o número de internações aumente desmedidamente? Nada. Ouvi
ainda hoje o Deputado afirmando que as internações não necessariamente
acontecerão em clínicas especializadas, mas também em leitos comuns de
hospitais. Onde está o caráter recuperatório? De onde surgirão esses leitos
que, pelo menos até onde conheço, simplesmente não existem nem para a demanda
rotineira de pacientes?
Sempre, SEMPRE mesmo me
perguntei: se existem bilhões e mais bilhões para a construção de estádios que
começaram a ser erguidos com a promessa de utilizarem apenas verbas privadas e “de
repente, não mais que de repente”, o quadro mudou no meio do caminho; se existe
a possibilidade de oferecer de presente um estádio para a empresa de um
bilionário administrar, se existem ofertas e mais ofertas de auxílios a países
vizinhos (ou não) em dificuldade, por que não é possível existir um
investimento pesado em saúde pública no que diz respeito ao problema dos
tóxicos? Não digo isso na instância da polícia combatendo traficantes – porque é
um tema que daria um post por si só. Digo isso no auxílio real ao dependente e
sua família, condições dignas de recuperação e reinserção na sociedade
tratando-o como o ser humano que de fato é – e não o marginalizando cada vez
mais – fazendo com que ele não tenha apenas seu organismo desintoxicado, mas
sim sua alma. Estruturas assim custam caro? Claro que sim. É necessária
estrutura física e humana, e muitas, mas muitas vagas, tantas quanto os
estádios estão oferecendo e que essas certamente não serão ocupadas. Ou alguém
vai me convencer de que um estádio em Brasília, em Manaus ou em Cuiabá terá,
sempre, quarenta ou cinquenta mil lugares ocupados? Não né.
Esse é o poder do “viva essa
energia” exercido sobre todos os brasileiros. Eu realmente não imagino o
resultado de uma hipotética enquete sobre esses dois eventos supracitados. Não
sei se a maioria das pessoas seria contra ou a favor, pois tenho ciência de que
estamos muito longe de ter uma sociedade realmente crítica (vide quadro
político), mas tenho plena convicção de que se as pessoas tivessem que escolher
entre o seu bem estar e qualquer outra coisa, escolheriam o bem estar. Bem
estar esse proporcionado através do velho chavão: “educação, saúde, segurança e
transporte público de qualidade”...que de tão velho já está desgastado e quase démodé,
mas ainda longe de acontecer em sua plenitude.
Não quero com tudo isso, dizer
que não acredito no Brasil e no seu poder de desenvolvimento. Acredito. Sou uma
eterna otimista. Mas tenho ciência de que isso só acontecerá quando vier à tona
uma reforma política. Não de estruturas políticas, mas de pensamento. Só
acredito que alguma coisa vai mudar quando a sociedade tiver criticidade
suficiente para se libertar do que é vendido, sair da caverna e basear suas decisões
no que é real, e não nas sombras. Abandonar todo e qualquer fanatismo político
e ideológico e entender que, como discutimos na mesma aula de sábado, a maioria
dos problemas tem sua solução (justiça) na ética e não na elaboração de uma lei
atrás da outra, e cada vez que fugimos dessa realidade nos afastamos mais e
mais da real evolução.
Enquanto as relações de poder
forem maiores do que o poder das relações, uma ditadura camuflada continuará
permeando a nossa história. A chave pra mim, como não é novidade nenhuma, é a
educação. É por isso que estudo, leio, penso, reflito, questiono. Porque
acredito na mudança e espero [participar e] vê-la acontecer.
Infelizmente não vejo saída a curto e médio prazo para uma mudança na estrutura política de nosso país. Vejo sim, na sociedades civil reflexões de um ou outro cidadão, como você nesse post e tantos outros que já li, implorando por mudança de comportamento ético, político, humano, educacional, enfim, mudança que não importa a quem não terá como levar vantagem. Mas, acredito nessa geração jovem. Penso que daqui a 20 ou 30 anos, teremos um mundo melhor. Parabéns filha, hoje e sempre.
ResponderExcluirBeijos, te amo.
Marli.
Eu também acho que não dá pra esperar uma mudança pra amanhã. Na verdade, acho que essa mudança nem acontecerá pra minha geração vivê-la. Mas ainda assim acredito que aconteça. E pra isso a gente tem chão ainda pela frente...
ResponderExcluirObrigada mãezinha!