domingo, 18 de agosto de 2013

A violência não pode ser banalizada!

Depois de quase dois meses sem escrever, volto. A pausa se deu por um conjunto de motivos: falta de tempo, porque a rotina alucinada nos esmaga; trabalhos da especialização, que também tem me consumido bastante, mas principalmente a falta do que escrever. Não que faltem assuntos, eles são abundantes sempre. Mas faltou o ímpeto, aquela alavanca que me faz colocar o notebook no colo, estralar os dedos e "mãos à obra".

Após as manifestações me deparei com uma cenário que, de certa forma, me preocupou - pra não dizer que entristeceu. Vivo logada no facebook, mantenho, através dele, contato com amigos e familiares que estão distantes, acompanho suas vidas e compartilho um pouco da minha, mas vi nesse período intenso de manifestações, as timelines da vida se tornarem verdadeiras arenas. Uma agressividade surgiu dessa disputa por foco e poder que, a meu ver, ultrapassou todo e qualquer limite aceitável no calor das disputas políticas. 

Pensando em tudo isso, refletindo, questionando o que vi, li, e provavelmente até postei, cheguei a uma conclusão - que não é necessariamente conclusão porque com o passar do tempo vemos que nada é tão definitivo - FALTA AMOR!

Falta amor das pessoas umas pelas outras, falta amor do estado pela população, falta amor - muitas vezes - da população pelo país, falta amor pela educação, falta amor pela família, falta amor pela vida. A falta de amor acarreta em desrespeito, e foi isso que vi. Preferi me retirar desse ambiente de gladiadores de "direita" e "esquerda" e ficar nos bastidores conversando, mediando e - sempre - refletindo. 

No entanto... 

Ontem, ao voltar da PUC com meu esposo, o ônibus em que estávamos foi parado em um pedaço do trajeto onde o tráfico e a violência de maneira geral são bastante presentes. Um policial entrou no veículo e ordenou que todos os homens saíssem com seus pertences, e que as mulheres permanecessem onde estavam e abrissem suas bolsas. Meu esposo e todos os outros saíram tranquilamente em direção a calçada. Enquanto isso uma policial entrou e revistou os pertences das mulheres. Ela agradeceu, desejou boa noite e bom descanso a todas. Até aí tudo bem, minha única apreensão era a de ser assaltada ou sabe-se lá o que, enfim, nessas horas tudo passa pela cabeça de uma pessoa medrosa - como eu. 

Mas quando olhei para fora fui tomada por um sentimento misto de asco e decepção. Todos os homens estavam emparedados como marginais, sendo revistados da maneira mais humilhante. Lógico que se eu tivesse visto homens que eu não conhecia teria ficado apenas chocada e decepcionada com uma abordagem desnecessária, um abuso de poder. Mas quando vi meu esposo, que estava voltando pra casa depois da aula conversando sobre a mesma e tudo mais - sendo tratado como um bandido, a fúria foi imediata. 

Enquanto os homens ainda estavam fora do ônibus, duas moças conversavam sobre o porquê dessa abordagem, e uma delas disse que há uma semana o irmão tinha sido assaltado exatamente no local onde estávamos parados. Nesse momento a cobradora da linha T1 interviu bastante irritada quase gritando que tem que se fazer mesmo porque semana passada foi pego um "colega nosso" com droga no ônibus. Nesse momento não consegui me conter. Disse que meu colega não era, e ela respondeu: "é sim, é da PUC". Ou seja, todos os milhares de alunos da PUC carregam, ou vendem, ou usam, ou sei lá eu o que...drogas! Achei melhor não falar mais nada devido a tensão do momento e a minha provável falta de filtro somada ao nervosismo. 

Os homens entraram no ônibus, o percurso seguiu, mas mesmo depois de ter chegado em casa não consegui digerir. Não deu. Por que não orientar os homens para abrirem suas mochilas? Por que não dar a eles o mesmo tratamento dado as mulheres que ficaram no interior do veículo? Por que uma truculência seguida de humilhação desmedida? Por que essa necessidade (desnecessária) de mostrar serviço? Mostrar a quem? Por que não agir com ênfase assim no núcleo do problema, que é no interior daquele bairro e de tantos outros onde o tráfico corre solto? O que fariam se encontrassem uma quantidade irrisória de qualquer coisa em alguma mochila, considerando que porte não é crime? Não estou dizendo, com isso, que é certo ou errado, mas apenas que de acordo com a nossa legislação, porte não é crime. 

Com tudo isso lembrei de um discurso do professor Vladimir Safatle, "A democracia para além do estado democrático de direito", que meu esposo até compartilhou um dia desses em suas incansáveis críticas à Brigada Militar, mas que me foi apresentado através de um dos professores da especialização que me inspira grande confiança e segurança para esse tipo de debate por ter em sua fala sempre a relação (ou falta de)  entre Direito X Justiça. Enfim, em seu discurso o professor Safatle expressa que a democracia não deve depender de instituições que funcionam mal, e, pra mim, a brigada/polícia militar na forma com que se apresenta hoje é uma das instituições mais falhas da nossa sociedade. 

Hoje, coincidentemente, o tema da aula foi bullying e violência escolar, e em um dado momento socializei o fatídico acontecimento da noite anterior. A primeira coisa que ouvi foi: "garanto que se estivesse do outro lado apoiaria a brigada". QUE LADO? Pra mim existem dois lados: o opressor e o oprimido. Se um dia me coloquei como opressora foi de maneira inconsciente, e me policio para que isso não aconteça, não apoio de maneira alguma nenhum tipo de opressão, truculência, chamadas de atenção sem contextualização, enfim, fiquei impressionada com o comentário. No mesmo assunto surgiram outros comentários do tipo "se você tiver um filho e ele sofrer bullying você exigirá uma atitude da escola, mas duvido que se for ele a praticar você admitirá uma intervenção da mesma maneira". Pois respondo aqui que SIM, admitirei. Até porque não tem gostar ou não gostar de uma ou outra medida, a escola precisa quebrar essa corrente de violência trabalhando o ser social com seus estudantes e suas respectivas famílias. Até porque, se o meu filho (a) se tornar um adulto truculento e violento, sem limites e noções, não caberá a mim gostar ou não, por exemplo, que ele seja preso. Se o mesmo fizer alguma coisa que, de acordo com a legislação, o leve a isso, que poder de decisão baseado no "gostar" ou "não gostar" eu terei? Nenhum. Quem disse que educar é fácil? Quem disse que romper paradigmas é fácil? Quem disse que reforma social é fácil? O papel de educar e orientar é sim da família, mas sejamos sinceros na análise da nossa realidade: muitas famílias não tem condições de dar essa orientação, então ela precisa partir da escola. As iniciativas precisam ser da escola para que um dia o quadro mude, para que esse estudante que foi beneficiado com a interferência seja um pai ou uma mãe mais presente amanhã.

Disse ontem, disse hoje pela manhã e continuo dizendo: a violência está institucionalizada e, por mais que isso seja gravíssimo, não é o mais preocupante. O mais sério é que as pessoas estão cada vez mais acostumando-se com isso, achando normal, achando que faz parte...Não é normal. Não é correto. Não é o caminho.

Por fim eu, que sempre fui e continuo sendo tão contra a generalização, não quero aqui generalizar e dizer que todos os policiais são o retrato da truculência e da opressão. No post Não é por 0,20 centavos fiz menção à Coronel Claudia Romualdo que, exercendo plenamente sua cidadania, viabilizou uma manifestação tranquila e pacífica em Belo Horizonte. 

Mas quero sim chamar atenção para um grupo de maus profissionais que infelizmente ganha o foco pelas atrocidades cometidas. 

Para terminar tinha pensado em colocar a letra da música Fix You, do Coldplay, que ouvi hoje a caminho da aula pensando o quanto a primeira estrofe tinha relação com como eu estava me sentindo - "When you try your best, but you don't succeed / When you get what you want, but not what you need / When you feel so tired, but you can't sleep / Stuck in reverse...", mas tem outra que simplesmente não pode passar batida hoje, em especial. E com essa me despeço!


"Dizem que ela existe pra ajudar!
Dizem que ela existe pra proteger!
Eu sei que ela pode te parar!
Eu sei que ela pode te prender!

Polícia!
Para quem precisa
Polícia!
Para quem precisa de polícia...

Dizem pra você obedecer!
Dizem pra você responder!
Dizem pra você cooperar!
Dizem pra você respeitar!

Polícia!
Para quem precisa
Polícia!
Para quem precisa de polícia..."