quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Ela pede socorro!

Como gosto de escrever sempre de coisas que estão acontecendo, hoje o assunto não poderia ser outro se não toda essa tragédia na região serrana do Rio de Janeiro. O luto das pessoas por seus amigos e familiares, a dor da perda de bens conquistados com uma vida de trabalho, enfim, o sentimento de tristeza em geral já foi mostrado de todos os ângulos por toda imprensa – até de forma sensacionalista, eu diria. Nesse momento de comoção coletiva e preocupação em oferecer socorro, é quase impossível refletir sobre o assunto. Mas as pessoas que estão distantes e por isso sentem-se menos atingidas – como eu, por exemplo – tem a obrigação de pensar em porquês, e mais importante que isso, refletir sobre uma cadeia de acontecimentos que se repetem, matam, desolam, e não cessam.

Em 2008 as enchentes e desmoronamentos que assolaram o Vale do Itajaí, em Santa Catarina, chocaram o Brasil e ganharam destaque até em jornais internacionais. Eu estive muito próxima de abrigos, lugares que desmoronaram, pessoas que perderam familiares, bens, e até mesmo a vida. Enfim, os cenários se transformaram e Blumenau, que sempre foi uma cidade linda, estava parecendo cenário de guerra. Por mais que a região já tivesse sofrido com enchentes devastadoras na década de 80, nenhuma trouxe tantos óbitos, pois era apenas o aumento do nível da água. Em 2008 o maior problema foram quedas de barreiras em vários lugares, varrendo casas e até bairros. Qual foi a diferença? Na década de 80 o número de ocupações em encostas e beira de morros e barrancos era extremamente menor do que hoje. Onde quero chegar com isso? Eventos da natureza, por si só, não são tão devastadores. Mas onde tem a mão do homem a tragédia pode ser muito, mas muito maior.


Tudo isso sem falar em tudo que aconteceu em Minas Gerais e no Espírito Santo em 2009, na tragédia que varreu Alagoas em 2010, nas freqüentes desgraças noticiadas em São Paulo e no Rio de Janeiro, e assim por diante.


Especialistas que estão estudando tudo que aconteceu (e ainda está acontecendo) na serra do Rio afirmam que o evento de desmoronamento acontece, naquela região, há centenas de anos. O diferencial é que há tempos atrás a terra que desmoronava tinha espaço suficiente para chegar onde fosse preciso sem fazer estrago, e hoje não tem mais. Quero somar a essa informação outro trecho de entrevista onde um especialista em solos fez um comparativo muito interessante: as pessoas falam, quando o rio sobe, que ele está no seu quintal. Mas na verdade, são as casas que estão no quintal do rio.


Esse é o raciocínio básico para chegar ao objetivo que quero com tudo que escrevi: as tragédias são tristes, muito, mas muito tristes. As perdas são imensas e muitas vezes insuperáveis. No entanto, elas acontecem há décadas e nada é feito. Digo isso porque a região serrana do Rio, por exemplo, considerada por especialistas como região de alto risco, foi loteada, vendida, recebeu toda infraestrutura como água, luz, TV a cabo, etc., para que fosse ocupada. Onde estavam as autoridades e os especialistas para dar um basta na ocupação visando, não o lucro, mas sim a vida?


Em Blumenau foi criada uma secretaria municipal só para prever fenômenos climáticos e tomar a atitude necessária para que não acabem em desastre. Se é uma atitude válida? Com toda certeza. Mas em uma região como essa, que já foi vitimada outras vezes, a secretaria podia existir antes de morrerem centenas de pessoas e outras tantas perderem tudo que tinham. Digo a mesma coisa sobre o Rio de Janeiro, e pode se estender para São Paulo, Minas Gerais, e assim por diante.


O poder público, independente da vontade dos moradores, tem por função priorizar o bem estar da população. É preciso mais seriedade na hora de construir loteamentos e estruturá-los, mais fiscalização com as áreas de risco, mais firmeza em tirar delas moradores irregulares, e acima de tudo, mais respeito com a natureza.


Essa sequência interminável de desgraças não vem à toa e nem é coincidência, mas sim uma resposta da natureza à implacável mão do homem. O aquecimento global, as queimadas, a falta de respeito com a fauna e a flora, a poluição dos rios e ocupação da sua margem, a destruição da mata ciliar, enfim, um conjunto imenso de desrespeitos e maus tratos com a natureza e o meio ambiente traz uma resposta implacável dos mesmos: destruição.


Por isso um dos trabalhos mais importantes da educação hoje é desenvolver nas crianças e suas famílias uma consciência de cuidado ambiental, incentivar a reciclagem, a plantação de mudas para reflorestamento, mostrar como é errado jogar lixo na rua ou nos riachos, enfim, coisas tão simples que podem evitar tanta tragédia.


Da mesma forma que cabe ao poder público como um todo, com um trabalho a curtíssimo prazo, privar pela vida dessas pessoas evitando que estejam em situação de risco, cabe a educação, em longo prazo, conscientizá-las para que não estejam mais nessa situação: nem morando em lugares de risco, nem poluindo, nem maltratando a natureza e desrespeitando seu espaço.


Ela pede socorro, e seu algoz é o homem.