segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

E é findo 2010...

Alguém mais, além de mim, fica com uma mania de análise quando chega o final do ano? Sabem aquela velha história de definir metas, dar continuidade aos projetos que tiveram êxito, corrigir o que não deu certo, fazer novos planos, enfim... Acho que tudo isso mexe com a cabeça da gente.

Lembro de quando estava atuando em sala de aula. Eu só conseguia fazer essa reflexão no começo de Dezembro, porque até o fim de Novembro era tudo muito corrido: finalização de projetos, elaboração das avaliações descritivas semestrais (muitas, mas muitas avaliações), preparação da festa de encerramento, enfim, uma empreitada. Mas passado tudo isso, normalmente no decorrer do mês de Dezembro, sempre gostei de avaliar – particular e coletivamente – o ano que se passou.

Claro, como praticamente todo mundo, pratico isso na minha particularidade, mas aqui quero falar da sala de aula. Eu trabalhava com a Jornada Ampliada II – minha maior paixão – e como a turma tinha crianças e adolescentes de dez a catorze anos, no próximo ano a maioria dos alunos estaria comigo outra vez, o que tornava nossas avaliações muito produtivas.

Nesses momentos de pura e descontraída conversa surgiram vários dos mais interessantes projetos que desenvolvemos. Sempre arquivei todo o trabalho dos alunos, desde maquetes até gráficos em alto relevo, textos, cartazes, enfim. E Dezembro era o mês de estender tudo no chão da sala e observar, sem cerimônias.

Como meus alunos a meu exemplo eram, em sua maioria, extremamente críticos, ouvi deles várias vezes um “nossa, que chato isso, não sei como terminamos”. E outras vezes um “ai profe, podíamos fazer isso todo ano, é tão legal.” Todas essas observações eram anotadas por mim com muito cuidado e precisão, para que os anos se seguissem cada vez melhores, mais produtivos.

Mas sabem o que era interessante? Por mais que eu adequasse os projetos aos assuntos e metodologias que eles gostavam, pensando que no final do ano a avaliação seria 100% positiva, sempre tinha alguém que fazia alguma crítica a algum trabalho, e quando eu observava a crítica não era infundada, muito pelo contrário.

Algumas vezes eu chegava a me frustrar, pois pensava não conseguir captar a necessidade dos meus alunos, mas quando eu analisava o resultado final, o quanto amadureciam e evoluíam no decorrer do ano, percebia que trabalhávamos bem: eu com eles, e eles comigo.

Foi quando em um determinado momento tive um epitáfio – adoro epitáfios – e entendi finalmente o porquê das críticas. E o mais engraçado é que elas aconteciam devido a uma das coisas que mais amo na educação: sua dinâmica.

Por mais que eu corrigisse para o ano seguinte o que os alunos pontuavam, sempre teria alguma atividade ou algum projeto que não agradaria, pois a cabeça dos alunos muda, o contexto muda, a minha postura muda, a deles também, e assim por diante.

Não quero dizer com isso que as avaliações não são válidas, muito pelo contrário, além de contribuírem para o crescimento profissional do professor, desenvolvem um senso crítico e poder de avaliação fantástico nos alunos.

Esse ano que passei fora da sala de aula, me fez lembrar da rotina do professor durante várias situações, mas nenhuma com tanta clareza quanto Dezembro. Isso não é nenhuma visão de Poliana nem nada, sei que a rotina da sala de aula é exaustiva e que quando essa época do ano chega os professores estão cansados, esgotados, estressados, etc. Mas não tem como não reconhecer que é uma data onde, se tiver realizado um bom trabalho, o professor olha para trás e vê que seu esgotamento é totalmente justificável, pois crianças e adolescente já não são os mesmos que eram no começo do ano. Cresceram, amadureceram, aprenderam muito, graças ao trabalho de formiguinha realizado pelos bravos mestres.

Por tudo isso, que cada um aproveite esse momento da melhor forma possível, e desde já, um Feliz Natal e um Ano Novo repleto de realizações, projetos e conquistas a todos nós.

domingo, 12 de dezembro de 2010

Tráfico educacional?

Não tem nem como usar um meio termo para o assunto de hoje, é simplesmente estarrecedor. O Zero Hora – jornal de grande circulação em Porto Alegre - dominical de 12 de Dezembro de 2010 trouxe a tona uma questão que de tão absurda chega a ser surreal: a venda, sim, VENDA de trabalhos escolares por professores particulares.

A reportagem “negociou” com professores um suposto trabalho de matemática para a 7ª série, e a surpresa foi que de oito professores, cinco aceitaram a missão. A negociação ocorre de forma tão natural que chega a ser assustadora. Os professores em momento algum cogitaram dar aulas para ensinarem o conteúdo que o suposto aluno teria dificuldade. Muito pelo contrário, deram dicas e sugestões que mostra o quão comum é, em sua rotina, tal absurdo. Um trecho da entrevista mostra claramente a estratégia: “Vou fazer como se fosse aluno. Vou fazer bem como se ele tivesse envolvido, até que nem posso fazer isso, né? Teria de dar aula e ele fazer”. Ainda aconselham a passar o trabalho a limpo, para não gerar suspeita.

Agora, como explicar isso?

Na própria matéria apresentada pelo jornal, uma profissional da educação afirma que tal ato se deve a estrutura falha do sistema de reprovação, gerando este uma sensação de fracasso e derrota. Ok, eu até concordo. Mas há como eximir de responsabilidades esses professores? E os pais?

Não, não tem como. Independente do sistema de reprovação ser falho, do próprio sistema educacional ser sucateado, enfim, do contexto não ser nada favorável, nada justifica professores que deveriam ENSINAR, orientar, honrar a proposta que fizeram ao assumir essa missão, se tornarem traficantes de conhecimento. É uma atitude tão desprezível que não consigo encontrar nenhum adjetivo para nomeá-la. Só tenho uma esperança: que isso seja punido com a severidade merecida.

Agora, falando dos pais: COMO ASSIM? Que espécie de pai compra um trabalho de final de ano assegurando que o filho passe de ano, mas não se preocupando em absoluto com o conhecimento adquirido e com o crescimento como aluno e como pessoa. E vou mais longe: que tipo de exemplo esses pais deram aos seus filhos ao tomar tal atitude? Fernando Becker, doutor em Psicologia Infantil e professor da UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul - declara que esses pais estão ensinando os filhos a delinquir. De acordo com ele, “Desse jeito, os filhos podem pensar assim: posso faturar uma grana fácil vendendo droga, por que não? É o extremo oposto de qualquer processo educacional. Quando um pai chega a esse nível, já tem um longo trajeto de concessões e de falta de atitudes enérgicas e de moral”.

É exatamente nesse ponto que eu queria chegar. Nessa situação o contexto problemático da educação no Brasil é extremamente secundário. O que vejo por parte dos professores é um oportunismo desmedido de pessoas sem nenhuma ética profissional nem respeito por nada nem por ninguém, e pelos pais um desespero por atingir os fins sem justificar os meios.

Isso é o retrato de uma sociedade que não dá importância ao trabalho, e sim ao resultado. A reprovação é um sistema que precisa ser revisto? Com toda certeza. Mas de que adianta pais lançarem os seus filhos para uma próxima série pelo simples fato de não ter um filho reprovado, sem este ter o conhecimento necessário? E digo mais: onde estavam esses pais na hora de fazer o dever de casa, acompanhar desempenho, participar de reuniões, conversar com professores, questionar coordenação, enfim, viver junto com seus filhos os desafios da vida escolar?

Sempre questiono e critico a educação no Brasil, porque de fato é uma das maiores deficiências do país, mas nesse caso não posso deixar de salientar o quão estarrecedoras foram as atitudes de professores e pais, e o quanto essas atitudes, infelizmente, terão um reflexo extremamente negativo sob os alunos e filhos.

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Bullying. A hora de falar é agora. Fale você também.

Motivada por uma campanha interessantíssima promovida pelo programa global Altas Horas intitulada “Bullying. A hora de falar é agora. Fale você também.” quero escrever hoje sobre isso. Por ser um assunto recente, pouco se sabe ou se é divulgado a seu respeito, mas é um problema tão sério que precisa, imediatamente, virar pauta em toda e qualquer discussão educacional e social.

O bullying começou a ser pesquisado há aproximadamente 10 anos na Inglaterra, quando se constatou que o mesmo tipo de prática discriminatória e intimidadora estava por trás de grande parte das tentativas de suicídio entre adolescentes. Depois de iniciada, essa pesquisa percorreu o mundo e infelizmente constatou-se que acontece em todos os lugares de formas muito parecidas.

Bullying quer dizer, de forma geral, intimidação. Mas é muito importante não considerar apenas como uma palavra estrangeira que significa intimidação, mas sim identificar essa expressão como uma patologia social e a expressão da crescente violência escolar. As vítimas dessa prática são intimidadas, humilhadas, agredidas, enfim, aterrorizadas, e apesar de estar presente em qualquer ambiente e poder acontecer com qualquer pessoa, o local que mais acontece é na escola. Estudos da Abrapia (Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e Adolescência) revelam que aproximadamente 30% dos estudantes brasileiros já sofreram algum tipo de bullying.

Ele permeia dois universos, o do agressor; que é sempre uma pessoa ou grupo que se sente superior, e o da vitima; que normalmente tem baixa autoestima e é retraída tanto na escola quanto no lar. Pode acontecer de diversas formas, desde boatos espalhados ridicularizando a vítima, agressões verbais, ameaças, exclusão social, até a violência propriamente dita.


E com a febre crescente de sites de relacionamentos e redes sociais, o cyberbullying tem crescido de maneira assustadora. Essa agressão se dá na internet, normalmente em forma de difamação ou incitação de violência. Um caso muito falado na época das eleições foi bullying não com uma pessoa, e sim com um grupo: o caso da estudante de direito que declarou “faça um bem a São Paulo, mate um nordestino”.

Como o principal local é a escola, os professores e a coordenação tem papel fundamental no controle severo dessa prática abominável. Na Inglaterra e nos Estados Unidos, muitos pais de vítimas processaram as famílias dos agressores e a escola, por não ter evitado ou denunciado a prática, e isso fez com que as instituições se tornassem extremamente severas e intolerantes com qualquer indício de bullying.


As conseqüências dessa prática são muito sérias, e apesar da maioria das pessoas associar isso aos assassinatos em massa seguidos de suicídios nas escolas ou suicídios adolescentes propriamente ditos, esse não é o pior problema. Explico: as tragédias noticiadas acontecem com uma minoria ínfima de vítimas. É horrível? Claro que sim, mas para cada suicida existem milhões de pessoas que sofrem caladas, e esse é o maior problema. Dificilmente uma vítima de bullying denuncia ou se manifesta de qualquer forma, alimentando assim o sentimento de desespero crescente. A consequência disso é o indivíduo se tornar cada vez mais introspectivo, fechado, omisso, depressivo, enfim, é praticamente como ceifar uma vida.

Infelizmente, como tudo que é relativamente novo, o bullying não tem uma legislação específica que o condene. Alguns estados, como o Rio de Janeiro, já esboçaram normativas punitivas a quem pratica, no entanto não há nada presente, por exemplo, na Constituição, a não ser a adequação de leis que defendem a integridade do ser humano, a garantia do seu bem estar, assim por diante.


É preciso que a sociedade como um todo mas principalmente nós, professores, nos tornemos cada vez mais sabedores de como constatar o bullying, denunciar o agressor e respaldar a vítima, para que essa violência não vire uma epidemia e seja passada de geração em geração, em um mundo onde a vítima de hoje é o algoz de amanhã.

domingo, 28 de novembro de 2010

Estudantes X ENEM

Como não poderia deixar de ser, eu quero – e preciso – escrever sobre o ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio.

O ENEM realizado no primeiro final de semana de Novembro foi, sem dúvida, o ápice de uma crise crescente na realização do mesmo. Esse exame que teoricamente deveria servir para facilitar o egresso de alunos no Ensino Superior tem aterrorizado os que se candidatam a ele. Os estudantes se aplicam incansavelmente para ter um bom resultado em uma prova que pode decidir seu futuro acadêmico, e ano após ano ela se mostra falha, imprecisa e desrespeitosa. Primeiro vazam gabaritos, depois dados dos inscritos são expostos na internet, e agora – com chave de ouro – se fecha mais um ciclo de fiascos.
Não vou nem entrar no mérito da confusão que ele causou nos vestibulares, pois existem universidades que o tem apenas com percentual de nota e podem simplesmente desconsiderá-lo; no entanto, há aquelas que o tem como próprio vestibular, e de uma hora pra outra é impossível montar um exame seletivo no improviso. Como resolverão? Não sei, acho que ninguém sabe.

Com tudo isso, um belo dia o advogado da União deu uma entrevista a um jornal falando que a instituição que ele defende não concorda com o cancelamento da prova e nem com a reaplicação da tão famosa prova amarela, porque seria uma injustiça com os outros estudantes que só tiveram uma oportunidade de fazê-la. Mas eu fico aqui me perguntando: a prova foi justa com os milhares de estudantes que tiveram que responder um exame confuso e mal preparado? E vou mais longe: será que era só a tal da prova amarela que tinha problema?

Que o ENEM deveria ser totalmente cancelado e reaplicado para todos que o fizeram, isso não tem nem discussão. Agora, já que o Ministério da Educação tem batido o pé seguidamente – e no Brasil quem bate o pé sai com a razão – para não refazer toda a prova, pelo menos poderia ter a dignidade de assumir um erro grotesco, ou melhor, uma sequência de erros, e tentar fazer o possível para confortar essas pessoas tão desoladas pela incerteza de seus destinos acadêmicos.

Agora resta esperar e ver quem decidirá o quê. Se o MEC falará mais alto deixando as coisas no dito pelo não dito – o que não é exatamente uma novidade – ou o Ministério Público se valerá do poder de decisão que tem e fará jus a sua real obrigação, que é defender o interesse do cidadão.

Eu espero com muita ansiedade que esse equívoco monumental seja corrigido, pois o país - representado aqui pelo Ministério da Educação - deveria mostrar, no mínimo, respeito por aqueles que se dedicaram e desgastaram.

E é preciso falar, é preciso reivindicar. Porque conivência gera reincidência.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

A realidade em cena.

Todo material de apoio que tem a função de qualificar o trabalho em sala de aula é importante, por isso quero falar hoje sobre quatro filmes: “Coach Carter, Um Treino para a Vida”, “Escritores da Liberdade”, “Vem Dançar” e “Um Sonho Possível”. Todos são baseados em fatos reais e quero fazer um paralelo entre eles para pontuar alguns aspectos.


O filme “Coach Carter, Treino para a Vida” traz a história de um ex-jogador de basquete que foi convidado a ser técnico do time da escola em que jogou. O cenário: uma comunidade mergulhada na criminalidade, onde o jovem era totalmente desacreditado das suas possibilidades, inclusive pela própria escola. O técnico passou a exigir que os atletas fossem, antes de tudo, bons alunos, e cobrava deles extrema disciplina. O desfecho é maravilhoso, mas as barreiras que o técnico enfrentou para fazer seu trabalho foram diversas, dentre elas os próprios pais, os professores, a diretora da escola, enfim, a concepção geral era de que aqueles jovens já estavam perdidos, não iriam para a universidade, nem se quer havia um pensamento de que eles concluiriam o colegial, no entanto, o investimento e a credibilidade do técnico fizeram com que tivessem um futuro digno. A maior dificuldade, por incrível que pareça, não foram os jovens, mas o próprio “sistema”.


No filme “Escritores da Liberdade” o resgate não veio do esporte, mas sim das aulas de Inglês que se tornam verdadeiras válvulas de escape através de diários. O cenário: o mesmo que o descrito anteriormente, e as dificuldades da professora eram, em geral, as mesmas. Ela chegou à escola cheia de projetos e se deparou com professores desiludidos que estavam meramente despejando suas respectivas disciplinas nos alunos, mantendo-se alheios a precariedade da escola e a realidade da comunidade. Quando a professora propôs mudanças e sugeriu estratégias, foi barrada pelos professores, pela direção da própria escola, e até mesmo por um órgão que equivale às secretarias de educação. Nem a livros os alunos tinham acesso para não estragá-los. Nesse contexto estarrecedor a professora abriu mão de praticamente toda a sua vida para dedicar-se aos alunos. A dedicação e a fé da professora mostraram que o investimento em uma juventude que todos consideravam perdida pode fazer dela um instrumento importantíssimo da sociedade.


No filme “Vem Dançar”, como não poderia ser diferente, os adolescentes vinham do mesmo contexto com um agravante: o trabalho do professor se deu em uma turma que vivia à margem dos marginalizados, quer dizer, a história se passa com a turma de alunos em detenção de uma escola que já se encontra deteriorada. Os adolescentes eram adeptos ao Hip Hop e adoravam dança de rua, e percebendo isso o professor aproveitou o gosto pela dança para ensiná-los dança de salão (dança essa tida como uma prática extremamente elitista). Como a recusa, obviamente, foi muito grande, o professor usou de estratégias inusitadas para mostrar aos alunos que tudo é possível. Também encontrou obstáculos entre os professores e a escola, mas teve nos alunos o apoio que precisa para fazer a diferença.


E por fim o filme “Um Sonho Possível”, que não tem como protagonista o professor, mas sim, o aluno. É a abordagem da situação por um ponto de vista diferente. O filme conta a história de um garoto que sofreu traumas terríveis durante a infância ao ser separado da família devido à dependência química da mãe, e desde então é mandado de uma família pra outra pelo estado. Com relação a isso o filme mostra uma crítica sutil sobre o fato de famílias receberem um “salário” do estado para adotar uma criança e acabar fazendo isso apenas pelo dinheiro. Entretanto, em uma situação inesperada, a vida do garoto se cruza com uma família rica que o acolhe e investe tanto na sua educação quanto no seu desenvolvimento de uma forma geral. A mudança que o garoto e a família fazem na vida uns dos outros é fenomenal, e a persistência da mãe da família é ponto fundamental: ela é uma pessoa muito influente e incentiva tanto a escola quanto os professores a acreditá-lo. Em um papel secundário no filme aparece a única professora que percebeu potencial no garoto, reconhecendo suas potencialidades e explorando-as.


Ao pensar na resenha de cada filme, a impressão que se tem é de que são dramas cinematográficos que, através de um roteiro programado, tem início, conflito, clímax e fim. Mas não. São histórias verídicas que tiveram desfechos felizes devido ao emprenho de pessoas que acreditaram em um ideal e trabalharam pra que isso acontecesse.


Os três primeiros filmes mostram professores que bateram radicalmente de frente com um sistema que, ao invés de resgatar os jovens da vida depreciativa que levavam, ajudava a empurrá-los cada vez mais para a marginalidade. Cada professor com uma estratégia diferente (basquete, expressão escrita e dança), resgatou os alunos na sua essência, ou seja, mostrando que eles tinham qualidades e que as mesmas podiam possibilitar um futuro diferente do presente. A lição que se tira disso é extraordinária, por que a situação dos professores ilustra, de fato, a realidade. Eles enfrentaram os obstáculos que principalmente a escola e o sistema educacional como um todo estipularam para um trabalho diferenciado, desde a falta de crédito para o trabalho realizado até o não investimento propriamente dito. Essas são questões cruciais. Passando por cima disso, o que é ainda mais importante de perceber é que os professores se mantiveram firmes em seus propósitos acreditando em seu trabalho e conquistaram o respeito de todos, principalmente dos alunos. Uma relação entre aluno e professor não pode ser baseada em outra coisa se não respeito e confiança mútua.


No último filme, como eu disse antes, o foco não é o trabalho do professor. Na verdade, é mais amplo, pois engloba a posição do estado frente às crianças que são retiradas da família por estarem em situação de risco, mas por outro lado são lançadas a própria sorte. Também mostra o comodismo de professores a ponto de não trabalhar a particularidade de um aluno, e sim, taxá-lo e ignorar suas necessidades especiais. Em contra partida, mostra o compromisso de uma mãe de família rica e com uma estrutura familiar organizada, que se sensibiliza e move céus e terras para proporcionar uma vida digna a alguém que não tinha chances. Relaciono essa história com as outras três porque, por mais que a família tenha investido e tirado o garoto de uma realidade degradante, o ponto fundamental para que ele conquistasse autonomia e dignidade foi a educação.


Esses são filmes que nos possibilitam profunda reflexão sobre a educação. Vendo o que essas pessoas fizeram pela educação e pelas pessoas, me questiono: existe limite? Quantas vezes ouve-se o discurso de que não é possível fazer, ou que é um trabalho a longo prazo, ou ainda que a sociedade não colabora, e assim por diante. Mas imaginem vocês se, como nas histórias mostradas nos filmes, a atitude partisse do professor. E não me refiro a um ou outro professor, e sim a todos. A mudança seria feita e todo o sistema educacional que é extremamente falho se obrigaria a trabalhar, a investir. Se é fácil? Claro que não, e os próprios filmes mostram o leque de dificuldades. No entanto, a missão do professor precisa vir acima de tudo. Sua prioridade precisa ser o aluno e sua real necessidade, sua especificidade, seu desenvolvimento e sua participação na sociedade. Isso significa o desenvolvimento integral do ser, e é só assim que a valorização do jovem marginalizado como ser humano passará a acontecer.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Cultivadores de mundo!

“Super fantástico amigo!
Que bom estar contigo
No nosso balão!

Vamos voar novamente
Cantar alegremente
Mais uma canção


Tantas crianças já sabem
Que todas elas cabem
No nosso balão


Até quem tem mais idade
Mas tem felicidade
No seu coração


Sou feliz, por isso estou aqui
Também quero viajar nesse balão!
Super fantástico!
No Balão Mágico,
O mundo fica bem mais divertido!


Sou feliz, por isso estou aqui
Também quero viajar nesse balão!


Super fantásticamente!
As músicas são asas da imaginação
É como a flor e a semente
Cantar que faz a gente
Viver a emoção


Vamos fazer a cidade
Virar felicidade
Com nossa canção
Vamos fazer essa gente
Voar alegremente
No nosso balão!


Sou feliz, por isso estou aqui
Também quero viajar nesse balão!
Super fantástico!
No Balão Mágico!
O mundo fica bem mais divertido!”


(Super Fantástico - A Turma doy Balão Mágico)


Há muito tempo penso em fazer um post com essa música, mas como ultimamente meu dever cívico falou mais alto, fui deixando de lado. Pois bem, vamos dar um tempo na política e, agora, esperar que tudo de certo né!


Super fantástico fez parte da trilha sonora da minha infância, e por mais que eu me sinta ultrapassada quando falo isso, continuarei a falar: as músicas da minha infância eram milhões de vezes melhores do que as que as crianças ouvem hoje em dia.


Quem sabe por eu ter vivido uma infância extremamente musical, sempre achei muito importante a musicalidade na sala de aula. E, é claro, Super fantástico é minha companheira fiel. Vocês acham que os alunos não gostam ou acham graça? Muito pelo contrário, adoram. A primeira vez que fiz uso dela foi durante o primeiro ano que trabalhei com Pré-Escola; para a apresentação no encerramento do ano letivo das crianças. Foi absolutamente lindo.


Mas alguém já prestou atenção, efetivamente, no que a música diz? Ela não cativa só pelo ritmo divertido. Ela tem uma letra simplesmente mágica. Quem nunca quis estar naquele balão? Pois eu sempre, SEMPRE quis. Ficava imaginando um cesto de palha muito grande onde coubesse o mundo inteiro, e a parte de cima era feita de muitos tecidos coloridos das mais diversas formas, como uma colcha de retalhos. E o fogo que fazia o balão subir era cor de rosa, é claro. Assim como eu, tenho certeza que muita gente se pegou pensando no tal do balão. Mas eu pensava nele assim quando era criança.


Quando me tornei professora, passei a pensar nele de formas mais mágica ainda. Pra mim, o balão é a educação. É exatamente como o balão que vejo a sala de aula e a minha atuação nela.


Pra mim, a sala de aula é um lugar de fraternidade, sem essa conversa de que todos são iguais, mas sim, acolhidos em sua diferença. A sala é um lugar de alegria, onde cada vírgula que é aprendida precisa ser uma novidade, precisa instigar a busca pelo conhecimento infinito. Na sala não há espaço pra discriminação, marginalização, preconceito, julgamentos, não cabe idade, cor, credo, enfim, cada um é cada um e juntos somos sempre mais. Na sala cabe o mundo, ah, com certeza cabe. Esse mundo se mostra através das pessoas que dela fazem parte, dos livros e filmes, das ilustrações, mas principalmente da imaginação. Essa é nossa mais valiosa passagem para onde quer que desejemos ir.


A sala de aula é um canteiro extremamente fértil, onde todas as esperanças, expectativas, os sonhos, os projetos, os anseios são depositados, plantados, adubados e, finalmente, colhidos. Muitas vezes essa colheita leva anos, décadas, e é feita quando os alunos já estão muito longe. Pode ser quando estiverem trabalhando, constituindo família, educando seus filhos, participando da sociedade, melhorando o mundo. Não depende de quando, e sim COMO. Se a sementinha foi bem cultivada, fará do mundo muito, mas muito melhor. Olha a nossa responsabilidade. Nós, professores, somos cultivadores de mundo.


Esse é nosso trabalho, essa é nossa missão. E assim como os viajantes do balão, sou feliz, mas muito feliz mesmo por fazer parte dele. Pra mim, a educação em toda sua totalidade é o balão, um balão grande, colorido, com fogo cor de rosa, e no seu cesto cabe o mundo inteiro!!!


quinta-feira, 14 de outubro de 2010

Democracia? Eu acho que não.

Fiquei um tempão sem escrever porque precisava organizar minhas ideias. Digo isso porque época de eleição mexe muito com os ânimos das pessoas – inclusive com os meus – e é preciso dosar o que vai ser dito para que seja, de fato, produtivo.

Muitas coisas me deixam indignada com a política, mas quero falar de algumas delas – as que considero mais importantes – separadamente para não perder o foco, pois acho que poucas pessoas tem o conhecimento necessário para julgar com clareza a grandiosidade do seu voto e o peso que ele tem.


Pois bem, quero agora explicar o porquê do título do post. Eu sempre soube que nas eleições existia um cálculo para determinar a eleição efetiva dos candidatos, as tais “cadeiras” de cada partido. Mas só há pouquíssimo tempo consegui entender o que isso significa e me decepcionei diante do fato concreto de não vivermos em uma democracia.


Os cálculos são simples e envolvem dois fatores: quociente eleitoral e quociente partidário. Para calcular o quociente eleitoral soma-se a quantidade de votos válidos de um estado e divide-se pelo número de vagas que o mesmo possui na Câmara dos Deputados. Para calcular o quociente partidário divide-se a quantidade de votos recebida por cada partido pelo quociente eleitoral.


Depois que tomei conhecimento disso percebi o poder de manipulação que os maiores sempre tem sobre os menores, uma cadeia alimentar doentia. Explico: a candidata que recebeu meu voto para Deputada Federal recebeu quase 130 mil votos. No entanto, ela não conseguiu se eleger. Alguém sabe por quê? Simples. Ela, defendendo seus ideais políticos, abandonou um grande partido ao qual pertencia e filiou-se a um bem menor, que pela sua quantidade de votos não conseguiu cadeira na Câmara. Por outro lado, outra candidata sem propostas concretas nem ideais claros, devido à grandiosidade de seu partido e ao investimento em uma grande campanha de marketing – que somados geram imensa popularidade pela falta de consciência política que grande parte dos eleitores tem – angariou nada mais nada menos que quase 500 mil votos, ganhando cadeiras para o seu partido e levando com ela Deputados que não tiveram nem a metade dos votos da minha.


Foi exatamente isso que aconteceu no tão comentado caso do candidato e agora, até que se prove o contrário, Deputado Federal, Tiririca. Ele recebeu aproximadamente um milhão de votos. Consequência: levou consigo políticos que não conseguiriam se eleger pela quantidade de votos recebidos, inclusive mensaleiro que deveria estar bem longe da política. Acaso? Claro que não. Isso foi uma estratégia – muito bem sucedida – do partido para angariar votos e conseguir garantir mais cadeiras na Câmara.


Agora, quem é que vai dizer que isso é democracia? Não é. Não tem como ser. Democrática seria a eleição onde os candidatos mais votados pelo povo o representassem. Democrática seria a eleição onde um candidato que recebeu 130 mil votos ficasse a frente de outro que recebeu 30 ou 40 mil. Por isso quando aparecem reportagens em Brasília vemos Deputados Estaduais e Federais sendo entrevistados e não sabemos nem de onde saíram. Claro, não fomos nós que os colocamos lá, foi um esquema, um conchavo para que SEMPRE seja beneficiado o maior, o mais poderoso. República? Não, não aqui.


Pensando em tudo isso vejo o quanto é importante nós, como professores, sermos sabedores desse tipo de coisa. Nós temos como responsabilidade formar cidadãos críticos e atuantes, que saibam participar e ser construtores da própria sociedade. E uma parte muito importante da criticidade é o conhecimento prévio para fazê-la.


Quero deixar registrados dois pensamentos para pura reflexão. Rousseau e Paulo Freire são ícones na educação democrática, personagens de importância ímpar que muito tem a contribuir com a formação de qualquer professor, e deixo conceitos advindos deles que tem total coerência com tudo que escrevi até agora:


“A pátria não subsiste sem liberdade, nem a liberdade sem a virtude, e a virtude sem os cidadãos (...). Ora, formar cidadãos não é questão de dias; e para tê-los adultos é preciso educá-los crianças.” (Rousseau).


“O educador democrático não pode negar-se ao dever de, na sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando, sua curiosidade, sua insubmissão.” (Paulo Freire).


Para encerrar, deixo a música “Perfeição” – Legião Urbana, onde há anos atrás foi pintado um cenário que, infelizmente, não mudou muito. Mas é preciso acreditar que um dia mudará, e que isso depende de cada um.