domingo, 16 de junho de 2013

Não é por 0,20 centavos.

Eu tinha em mente, até metade da semana, outro tópico para escrever. No entanto, é impossível ignorar tudo que está acontecendo com relação ao Movimento Passe Livre, é impossível deixar de registrar minha opinião tanto sobre o momento histórico que estamos vivendo quanto sobre a repercussão do mesmo.

O título do post se dá porque tenho ficado extremamente indignada ao ver que uma mídia manipuladora faz questão de perguntar: “mas todo esse vandalismo por causa de 0,20??”.

Não...não é por isso. Quero organizar meus argumentos em cima da fala do [pseudo] jornalista Arnaldo Jabor. Ele começa perguntando “o que provoca um ódio tão violento contra a cidade?”. Pois então, querido Jabor, o ideal seria perguntar isso aos policiais militares que, mesmo com os MANIFESTANTES (e não vândalos) gritando “SEM VIOLÊNCIA” a plenos pulmões, avançaram para os mesmos com uma fúria desmedida. Existem imagens de todos os ângulos que registraram  a truculência e repressão da força policial. Nem vou comentar o fato de comparar os manifestantes com facções criminosas que queimavam ônibus, porque me causa um asco tão grande tal comentário, que eu nem conseguiria terminar de escrever. Em seguida afirma com veemência que no meio dos protestos “não havia pobres que precisassem daqueles vinténs”, alegando que quem estava nas ruas eram filhos da classe média. Eu não conheço as pessoas que ali estavam, mas não acredito em tal afirmação. Mesmo que fosse verdade, que sorte da sociedade ter seres humanos altruístas que pintam faixas e vão para as ruas lutar por uma causa que não é de todo sua. De qualquer maneira, como eu disse, no protesto “dos vinte centavos” está uma manifestação política que estava, há muito, adormecida; uma juventude bradando por um país melhor, mais digno e pleno. Nosso querido Arnaldo segue seu derrame de hipocrisia declarando que “talvez seja influência da luta na Turquia, justa e importante [...] mas aqui, se vingam de quê?”...ora, querido comunicador, não se vingam de nada, apenas fizeram jus ao marketing de que “a rua é a maior arquibancada do Brasil”, e nessa arquibancada expressam sua indignação com o pouco caso que nós todos, inclusive Vossa Senhoria, sofremos com os rumos da nossa política principalmente nessa época sombria da nossa história que antecede a copa do mundo e uma total contingência sobre o amanhã. Quase no fim interroga: “por que não lutam contra o Projeto de Emenda Constitucional 37? [...] Talvez eles nem saibam o que é PEC 37...”. Sim, nobre senhor, eles sabem. Tu é que não tivestes sabedoria e amplitude (ou simplesmente vontade) de interpretar que essa luta é uma das muitas que permeia os tais 0,20. Não subestime uma juventude politizada, não se preste a um papel tão ridículo... Termina afirmando que “esses revoltosos não valem nem vinte centavos”. Quem não vale, querido amigo, és tu, que tem um grande espaço na mídia para falar o que bem entender sem precisar levar bomba de polícia, cheirar gás lacrimogêneo, levar tiro no olho, ser agredido e humilhado... e nem assim tens a dignidade de fazer valer sua cidadania e sair da sua bolha burguesa e limitada.

Em contra partida ao comentário repulsivo supracitado está o quase desabafo do apresentador João Carlos Albuquerque, do canal ESPN, chamando o protesto de protesto e os manifestantes de manifestantes (não usou, em momento algum, o termo vandalismo), dizendo que SIM, as manifestações acontecerão em massa agora porque nesse exato momento o mundo inteiro está de olho no Brasil. É a hora da voz do povo ser divulgada, e não a de uma política que camufla as informações e só “vive essa energia”. Parabéns a ESPN por ter jornalistas de verdade fazendo um trabalho limpo e imparcial, enquanto as grandes redes são verdadeiras massificadoras sociais (para não usar termos mais fortes).

Somado a tudo isso veio um trabalho que um colega apresentou na pós ontem, onde trouxe citações de Zygmunt Bauman falando que muitas vezes é mais prudente se ter medo de quem cumpre a lei, do que de quem a descumpre. Haveria afirmação mais pertinente que essa para o post de hoje? Não. Na ditadura getulista os “cabeças de tomate” causavam total terror à população por “cumprirem as ordens” de um regime ditatorial. Durante o nazismo, a Gestapo tinha um poder terrorista ainda maior por cumprir as ordens de Hitler. Com o passar dos anos muitas lutas acarretaram em muitas conquistas, inclusive a “democracia”, que coloco entre aspas porque acredito que ainda precisamos evoluir muito para chegar a ela. Digo isso porque a postura da tropa de choque da polícia militar reproduziu a repressão dessas duas forças do passado, calando a voz do povo em uma luta onde um lado portava armas e o outro, a voz.



É preciso refletir sobre até que ponto podemos defender que vivemos em uma democracia onde existe o direito (inclusive constitucional) de manifestar o que quer que seja. Acredito que nessa última semana em particular isso foi colocado em cheque. No entanto, para servir de alento, hoje circulou nas redes sociais a atitude honrosa da Comandante do Policiamento de Belo Horizonte, Coronel Claudia Romualdo, que contrariou liminar proibindo protestos e viabilizou uma manifestação pacífica tanto para os manifestantes, que puderam expor seu protesto; quanto para os policiais, que apenas abriram caminhos para que a democracia acontecesse. PARABÉNS Coronel, e que muitas Claudias apareçam por aí.

O apoio às manifestações vem de todos os lugares, inclusive do exterior. Isso sim é mundialização. Isso sim é globalização. Não é todo mundo ter o mesmo computador, o mesmo celular, ouvir as mesmas músicas, tirar férias nos mesmos destinos...é o mundo se mobilizar por uma mesma causa: a da justiça – não judicial, mas sim, humana.

Paris

Dublin

Nova Iorque

Berlim

Parabéns aos manifestantes, pela atitude e coragem. Parabéns aos brasileiros e estrangeiros que, de onde quer que estejam, mandam mensagens de apoio à “revolução”.  Parabéns aos manifestantes que sabem sair de casa e ter a grandeza de serem melhores que aqueles que os coagem. Parabéns  pouca mídia que retrata, realmente, o que está acontecendo. Parabéns a quem não desiste de lutar, não desiste de pintar a cara e gritar por um país melhor. Parabéns aos blogueiros (que também são mídias) que não param de divulgar o que [realmente] acontece.

Professor carregando policial ferido durante a manifestação pelo aumento salarial. Manifestação essa que os professores também foram tidos como vândalos.

Que vergonha da polícia militar, pela truculência e postura indesculpável com os manifestantes e jornalistas que cobriam as manifestações, que vergonha (ainda maior) de quem manda que isso seja feito, que vergonha da mídia vendida que prefere dizer que não temos motivos pra lutar, que vergonha do cidadão que não entende a importância dessa luta e prefere fazer coro a quem chama esses revolucionários de bandidos...que vergonha de tão pouca gente se mobilizar.


Não vivi a ditadura militar, não vivi as diretas já, não vivi a transição de regime político...mas vivo o Junho de 2013 e daqui a muitos anos contarei aos meus filhos que pude ver a história acontecer...pude ver uma mudança ser gerada em meio ao sangue de quem brigou por ela. Daqui alguns anos essa luta estará nos livros de história e as crianças e adolescentes poderão se orgulhar de quem exerceu seu papel de cidadão. Utopia? Pode ser, mas se não a tivermos, de que vale viver?


5 comentários :

  1. Belo texto, Tali!
    Compartilho dos mesmos sentimentos que tu!
    me sinto muito mal, vendo manifestantes dizendo "sem violência" e sendo brutalmente espancados... uma jornalista ficou cega... pessoas foram presas por portar vinagre.
    não sei qual sentimento é mais forte: o de tristeza ou o de vergonha alheia.
    é horrível, a polícia espancando as pessoas como se elas literalmente fossem uma ameaça, inimigos... e no final esquecem do por quê de tudo isso?
    por que tanta fúria?


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  2. Obrigada!

    E não sei responder...acho que ninguém sabe...as pessoas estão tentando entender e não conseguem.
    E o sentimento de impotência é gigante. Escrevo porque me sinto mal só assistindo televisão e não fazendo nada...e sinto demais pelos que estão sofrendo por brigar. Acho que o pior sentimento é exatamente esse de misto de tristeza com vergonha...

    Mas ainda acho que vale a pena lutar!

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  3. Tali, parabéns pelo texto, traduziu muito do que sinto no meu peito nesse momento. Não tem como entender tanta fúria e tanta violência dos policiais contra pessoas reivindicando seus direitos... e ver essa mídia chamando de vândalos os brasileiros que saem às ruas, enquanto os estrangeiros que saem protestar por mudanças são ativistas, são politizados...
    Mas ver tanta gente unida se organizando nesse movimento, e acreditando que podemos de fato construir um Brasil melhor, isso dá força pra gente, renova nossas esperanças! Há quanto tempo esperamos por essa mobilização? Amanhã também vou sair às ruas, me somar ao movimento, e embora bata o receio da repressão violenta, vale a pena acreditar num sonho! Que nossas reivindicações sejam ouvidas!

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  4. Obrigada Dani...me sinto, muitas vezes, hipócrita em ficar em casa só escrevendo e compartilhando. Ontem vi a foto de um rapaz numa manifestação segurando um cartaz escrito "Saí do facebook" e foi um tapa de luva. Acho que tem que sair mesmo. Não sei de manifestações aqui em Poa, vou até procurar. Se tiver, com certeza VAMOS (eu e o marido), porque a gente tem mais é que participar.
    Como escrevi no post, isso é história sendo feita...

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  5. Parabéns pelo post filha! Mais uma vez, você exerceu sua cidadania retratando o sentimento de muitos brasileiros. Estou muito orgulhosa dessa juventude que sabe o que quer e entendeu que a nação unida tem muita força, e principalmente pelo manifesto pacífico.

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